5 de dez. de 2009

Polo de Cosméticos - Aquece economia do Grande ABC

Aos 50 anos, a prima pobre do Grande ABC conquistou a beleza e está ficando rica. Ninguém ousaria repetir, hoje, a pecha de que Diadema é apenas a prima desvalida dos ricos Santo André, São Caetano e São Bernardo do Campo. Os jornais lhe deram outros nomes, como "Capital da Beleza", ou "Cidade Beleza". O estopim de tudo foi a descoberta de que muitas das empresas do município fabricam um mesmo tipo de produto: cosméticos. Alguém juntou a essa constatação a surrada, mas pertinente, máxima de que a união faz a força. Estava-se em 2002. Foi assim, meio por acaso, que surgiram as bases para a criação do Pólo Brasileiro do Cosmético. Justamente em Diadema, que este ano faz 50 anos de emancipação.

As indústrias da área de cosméticos sempre estiveram registradas nos cadastros da Prefeitura. Pequenas e médias, na maioria. Só que ninguém tinha tido a curiosidade de somar quantas eram. Quando, afinal, se fez isso, surgiu uma realidade surpreendente. Existiam 130 fabricantes de cosméticos. Com mais 300 empresas de insumos, como matéria-prima, embalagens, rótulos, chegava-se a 430. Pequenas, com oito empregados, até gigantes como L’Oreal, Unilever, Davene. Tinha-se, ali, toda a cadeia produtiva, de matérias-primas a produtos acabados.

Hoje, sete anos depois, o Polo tem expressão nacional, e faz negócio no Exterior. No ano passado movimentou R$ 2,8 bilhões. Isto é, cerca de 10% da produção do setor no País. O Polo gera 11 mil empregos (8 mil diretos e 3 mil indiretos). Faz bonito (e sem maquiagem), mas e a crise mundial? Este assunto não tirou o sono de seus industriais. Acham que se 2009 não for um ano excepcional, também não será nada decepcionante.

O mercado, afinal de contas, tem tido aberturas antes impensáveis. Uma empresa de Diadema, a Valmari, vende um hidratante usado por comissários de bordo. Nada que surpreenda, diante do crescente interesse masculino por produtos para cabelos e hidratantes. A vaidade feminina, por sua vez, está cada vez mais precoce. Muitas meninas de dez anos não saem de casa sem sombra e batom.

A qualidade dos cosméticos também mudou: colágeno vindo de feto de boi? Éca! O princípio ativo continua importante para firmar a pele, mas hoje é obtido de algas.

Há 20 anos, quando as primeiras fábricas de cosméticos chegaram a Diadema, crianças brincavam de boneca e homens escolhiam uma boa loção pós-barba. Empresas em busca de um lugar para se instalar logo pensavam, como ainda hoje, no ABC. São cidades com excelente infra-estrutura e acesso fácil. Mas preços proibitivos, se o interessado for uma pequena indústria. O D – Diadema – surgia como boa alternativa.

A infraestrutura chegara ao Município impulsionada pela forte arrecadação da área metalmecânica. Naquela época, os carros eram feitos no ABC, mas muito limpador de parabrisa, amortecedor, espelho retrovisor, entre uma variedade de outros itens, vinha de Diadema.

A cidade é mais próxima do centro de São Paulo do que Santo André. A paulistana Avenida Cupecê segue Diadema a dentro, embora mude de nome. O porto de Santos está a 70 quilômetros. Os pioneiros pequenos fabricantes de cosméticos que chegaram pela Rodovia dos Imigrantes, ou pela Anchieta, se instalaram em ruas de terra. Hoje, esse cenário é apenas uma lembrança.

Rene Lopes Pedro e a indústria em que trabalhava, a Coper, chegaram em 1984. Não foram os primeiros. Já havia na cidade duas pequenas fábricas de cosméticos. A quarta indústria veio logo depois, a Davene. Rene tem hoje sua própria empresa, a Indústria Brasileira de Aerossóis. E um cargo de destaque. É o presidente do Polo Brasileiro do Cosmético.

Quando fala do nascimento do Polo, lembra-se do então presidente do Sindicato dos Químicos de Diadema, Sérgio Novaes. Foi ele o primeiro a se impressionar com o número de fabricantes de cosméticos da cidade. Ele e seu pessoal estavam pelas ruas, visitavam indústrias. Assim puderam perceber o que ninguém notara. "Em uma conversa comigo e com o ex-prefeito José de Filippi, o Sérgio chamou nossa atenção para esse fato: Diadema era um polo de cosméticos", diz Rene.

José de Fillipi, na época candidato pelo PT, acabou se elegendo prefeito. Os projetos para a criação oficial de um polo de cosméticos esfriaram um pouco, mas acabaram andando. Começou com uma pequena sede, no prédio da Prefeitura. E uma grande discussão. Rene e outros empresários não queriam que o polo fosse apenas uma entidade representativa (afinal, o setor sempre esteve ligado a uma associação nacional e um sindicato). O que queriam era uma entidade que cuidasse de negócios.

"Queríamos fomentar negócios, ajudar a pequena empresa a comprar melhor para vender melhor, capacitá-la para enfrentar cada vez mais a economia globalizada", lembra Rene. "Em suma, uma associação sem-vergonha. Sem-vergonha de fazer negócios."

O trabalho mais difícil foi convencer as empresas de que eram concorrentes, não inimigas. "No Brasil, os mercados foram muito fechados, por muito tempo, e as pessoas encaravam os concorrentes como inimigo." A pregação de Rene era que em vários setores, no mundo, as empresas são organizadas, para poder sobreviver.

Dava como exemplo a cerveja. A Alemanha é um dos maiores produtores do mundo. "Mas, se for ver bem, há dois ou três grandes fabricantes. Depois, vêm milhares de pequenos, que sobrevivem em nichos de mercados preservados." Por fim, entrou na conversa a Rua 25 de Março, de São Paulo, que se autodenomina o maior shopping a céu aberto da cidade.

"Sou neto de libaneses, e via que os filhos deles tinham uma concorrência muito grande na 25 de Março. Um abria uma loja de tecidos, o concorrente vinha e se instalava na porta do lado. Eles trabalhavam com o mesmo produto, e ‘guerreavam’ o dia todo, para ver quem vendia mais barato e atendia melhor. E na hora do almoço iam juntos para o Almanara (o tradicional restaurante de comida árabe)."

Estabelecido que concorrente não é inimigo, e que precisavam se unir, começaram as ações práticas. O prefeito criaria oficialmente o Polo Brasileiro do Cosmético, que logo teria personalidade jurídica e sede própria. O vice-prefeito, Joel Fonseca Costa, assumiu a Secretaria do Desenvolvimento Econômico e Trabalho, com a missão de viabilizar o Polo. "Disseram que eu estava trocando a graxa pelo creme de beleza", diverte-se Joel, ex-metalúrgico.

O caminho para divulgar o Polo e seus produtos eram as feiras. Os empresários sabiam disso, mas ninguém desconhecia que era uma solução cara. Joel cuidou das "feiras em ações cooperadas". E a largada deu-se em grande estilo: ainda em 2002 participaram da Cosmoprof, em Bolonha, Itália – tida como a maior feira de cosméticos do mundo. As empresas ratearam o custo de um estande coletivo, e a Prefeitura pagou o aluguel do espaço.

A fórmula repetiu-se na primeira feira de que participaram no País, a Beauty Fair, feira latino-americana de cosméticos e beleza, no Expo Center Norte, em São Paulo. Vieram outras em São Paulo e no Exterior. Londres, Dubai (Emirados Árabes Unidos), San Diego, na Califórnia. Os produtos Made in Brazil, da cidade de Diadema, despertavam grande interesse. Hoje, o Polo tem um especialista no estímulo de exportações, que acabaram se voltando mais para a América Latina e Caribe.

Entre uma e outra feira, os empresários do Polo desencavaram outra velha máxima: "Se Maomé não vai à montanha, a montanha vai a Maomé" (palavras de Rene Lopes Pedro, o presidente do Polo). Criaram um sistema de rodada de negócios. Em hotéis por capitais do País recebiam convidados escolhidos entre potenciais clientes. Entre eles donos de supermercados, perfumarias, redes de farmácia.

Ouviram de muitos interessados que não compravam os produtos de Diadema por ter dificuldade de se comunicar com as empresas. Problema que a partir das rodadas não existiria mais. Em outra fase, voltaram-se para o Mercosul. Repetiram as rodadas em Santiago e Buenos Aires, com apoio da Prefeitura e do Banco do Brasil. Por fim, foram a cidades do rico interior paulista.

Na retaguarda, em Diadema, os industriais cuidavam, como fazem ate hoje, da racionalização de custos de produção. Uma das atividades estratégicas são as compras em conjunto. Entram nisso de matéria-prima a material de escritório, de limpeza. A fórmula, como está evidente, é comprar grandes quantidades, o que reduz o preço. O álcool para cosméticos chegou a sair 30% mais barato.

Outra prática lógica é que os integrantes do Polo se abastecem na cadeia produtiva. A empresa de Rene, o presidente do Polo, fabrica aerossóis. Os outros industriais mandam seu produto para Rene. Ele os envasilha, insere o aerossol, e manda o frasco pronto para o cliente vender.

Ao contrário dos cosméticos de antigamente, os atuais garantem resultados. Um produto contra rugas deve efetivamente eliminá-las. Os cremes, hoje, não ficam só sobre a pele, mas penetram nela. "São produtos mais ativos, eficazes e de vida mais longa", diz o diretor comercial da Valmari, Silvestre Mendonça de Resende.

A empresa investe no diferente. Sabonete em pó (um pó finíssimo, para pele oleosa), cápsulas com produto para o contorno dos olhos (rompe-se com os dedos cada pequena cápsula para obter o conteúdo). E a linha Gourmet, sabor morango ou chocolate, com várias propriedades. Funciona assim: sopra-se o lugar onde o produto foi passado (braço, por exemplo) e ele aquece. Cheira-se, e sente-se o aroma do morango, se for o escolhido. Mas não é só: também é possível sentir-lhe o sabor, lambendo o lugar da aplicação.

As indústrias atuais dispõem de produtos modernos, como explica a diretora de Pesquisa e Desenvolvimento da empresa, Maria Rita P.L. Resende. A elastina, que dá elasticidade à pele, era feita de vasos do pescoço do boi adulto. O colágeno, firmador da pele, vinha, como se viu, de fetos de bois. O mesmo com a placenta, que tem grande poder para combater as rugas. "Hoje, esses produtos deixaram de ser de origem animal para ser de origem marinha ou vegetal", diz Maria Rita.

Silvestre Resende reage quando alguém se refere aos cosméticos como supérfluos. "Cosmético gera riqueza, trabalho. Nada disso é supérfluo." Dá como prova o fato de o setor pagar até 42% de IPI, até 25% de ICMS e 12,5% de PIS/Pasep e Cofins. "Tal indústria não pode ser chamada de supérflua."

O Polo Brasileiro do Cosmético tem uma importante vertente, a da capacitação e treinamento da mão-de-obra. Formou parcerias com entidades como o Sebrae, a agência que apóia o pequeno empresário, Senai, Ciesp e outras. Esse trabalho ficou a cargo de Joel Fonseca Costa, que foi secretário do Desenvolvimento Econômico e Trabalho da Prefeitura. Ele diz que, no Polo, o alvo não são só trabalhadores das fábricas. "Precisávamos também capacitar profissionais de beleza." Ou seja, cabeleireiros, maquiadores, manicures, estetas corporais, entre outros que trabalham com cosméticos.

Foi assim que surgiu o Espaço Beleza, na Fundação Florestan Fernandes, municipal. Joel é o presidente da fundação. O espaço tem várias salas equipadas, onde são ensinados tratamentos faciais e corporais, cuidados e tintura de cabelos, decoração de unha, depilação básica e artística, para citar só alguns. Depilação artística, explica a coordenadora Tânia Yasmin, consiste em cortar, dar formas e pintar um desenho, inclusive nos pêlos pubianos. No ano passado, o curso teve 1.600 alunos.

Esses futuros profissionais são levados às feiras de que o Polo participa. E não só eles. Há também as recepcionistas dos estanderes. Muitas dessas moças pensam em voos mais altos, como Prisciliane Barbosa, 25 anos. Elas são maquiadas e preparadas para esses eventos, para estarem lindas. Isto estimulou em Prisciliane a perseguição de um ideal, o de ser modelo-fotográfico.

A moça, formada em Psicologia, trabalha em parques estaduais do ABC. Costuma estar na platéia de programas populares de tevê, o que leva seu rosto para o vídeo. Recentemente, foi escolhida, entre outras garotas da platéia, para participar de um quadro. Antes de ir para esses programas, Prisciliane cuida do cabelo e da maquiagem. E todo dia usa creme hidratante no corpo e nas mãos. Comprado em lojas de Diadema.

fonte: REVISTA LIVRE MERCADO

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